quarta-feira, 21 de março de 2012

Na cama estavam espalhados os inúmeors discos dos Beatles, ocultados pela manta marrom. Ele gostava de dormir sempre coberto, mesmo nos dias mais quentes. Tinha frio nos pés.
Na cômoda, ele havia deixado o cinzeiro. Andava fumando muito.
Andava irritado também.
Talvez uma coisa levasse a outra. O certo é que eram quase duas carteiras por dia.
O odor de cigarro alastrava-se pelo quarto compondo um véu de fumaça que ele inalava profunda e diariamente.
Depositado sobre o tapete, estava o violão. Intocado. Ao lado, o amontoado de papéis rabiscados, formando uma espécie de alucinação literária. Iguais a estes, haviam mais centenas encaixotados no armário.
As cortinas estavam fechadas e assim conservaram-se durante semanas. A claridade da janela o incomodava. A brisa o incomodava. O barulho o incomodava.
O que ele precisava mesmo era de escuridão, pra acomodar aquela imensidão de covardias. Letícia G.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Divide comigo?

Ela sentia muito que dessa vez não fosse possível dividir. Não havia a possibilidade de ser metade. Ou era tudo, ou era nada.
Ela sentia muito porque sempre dividira seu espaço. Quando criança, a casa embora quase sempre vazia durante o dia, enchia-se por completo durante a noite, quando as “pessoas grandes” voltavam para jantar.
Sentia muito porque sempre dividiu suas angústias com a avó Dida. Ela sabia que naquele colo rendado, os problemas eram costurados a mão a fim de entremear neles, toda a sua sabedoria.
Também sentia muito porque sempre dividira seus sorrisos. Certas vezes eles vinham em forma de gargalhadas de faltar o ar. Em outras, ele aparecia quase que forçado, para que o seu “sorrir” erguesse mesmo que minimamente, o cantinho dos lábios do outro.
Mas agora era diferente.
Todo o amor dela, agora tinha que ser dele. E ele não queria dividir.
Foi quando ela pensou: Como é que se explica pra ele, que o amor dela não consegue viver aprisionado?
Na verdade ela acostumou a chamá-lo de: amor livre! Letícia G.