terça-feira, 17 de abril de 2012

Você tem fome de quê?

Sem tempo, hora ou destino, o rapaz de sorriso amarelo sente fome. Nas costas, carrega uma mochila, com todos os seus pertences. Presa a ela, está a barraca, com a capa azul já rasurada. Ele levanta-se e atravessa a Praça Rui Barbosa - uma das mais movimentadas de Curitiba – e segue em direção ao Restaurante Popular. Em frente à cabine, a nota de dois reais é retirada do bolso da calça e trocada por um dos dois mil tickets refeição vendidos diariamente. A moeda de um real restante é guardada cuidadosamente para o almoço do dia seguinte.

Gustavo sobe a escadaria rodeada por muros esverdeados e se posiciona em meio à fila de espera para a entrada no restaurante. No cardápio do dia: arroz, feijão, peixe, macarrão, salada e fruta. O cheiro da comida fresca se esvai pelas janelas e é sentido do lado de fora do ambiente, aguçando ainda mais a fome de quem chega a esperar até quarenta minutos em pé para almoçar. Gustavo não se importa. Ele não tem horários e nem preguiça. Há cinco anos seus pés trafegam pela América Latina em busca de aprendizado. O cultivo da terra e a construção de casas de cimento são atrativos que aproximam o argentino do próximo destino traçado: Paranacity. Em Buenos Aires, cidade natal, as casas da comunidade em que morou durante toda a infância – passada boa parte na rua - são construídas com barro e materiais recicláveis. Órfão desde um ano de idade, Gustavo foi criado pelos avós até completar 15 anos - quando a morte dos tutores- o obrigou a andar em par com a solidão. De lá para cá, ele convive, até muito bem, com ela. Prefere assim, porque diz que “não quer ter responsabilidade sob ninguém”, mas comenta sobre o filho de seis anos que mora com a mãe em Buenos Aires. Pergunto se ele sente saudade da família. “Saudade?” ele pergunta. “Não entendo o que quer dizer”, responde risonho.

O estômago ronca. A fila anda e Gustavo despede-se com um forte aperto de mão seguido pela repetição de um aviso fixado na parede do local: "Volte sempre!" Letícia G.

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